16/12/2018

Sangria Desatada, faixa a faixa


Lancei um disco.

Na verdade não é bem um diiiiisco, um álbum inteiro, e sim um EP (S.m., do inglês Extended Play. Uma gravação musical longa demais para ser considerada um single e curta demais para ser classificada como um álbum; geralmente possui de 4 a 6 faixas). Já fazia um bom tempo que eu queria gravar algumas composições próprias: nos últimos 10 anos, as únicas músicas que registrei sonoramente tinham sido o single "Pequena Morsa / Festa Junina em Banheiro" (2009), com minha banda ABUNN, e a música-tema do curta A Menina Que Comia Música (2015).


Em 2018 resolvi criar vergonha na cara e tirar algumas canções da famigerada gaveta de projetos inacabados. Primeiro gravei demos caseiras, que mandei pros amigos em busca de feedbacks. A intenção era achar um estúdio e gravar tudo em esquema voz e violão, simplezão mesmo. Mas aí, através de um amigo, conheci o Connor, um músico australiano que também mora em Berlim e não só se dispôs a gravar e mixar as 5 músicas, como também ofereceu seus talentos de multi-instrumentista e tocou de tudo, incluindo bateria, baixo, guitarra, piano e percussão.

Foram 4 sessões, espalhadas ao longo do verão europeu, num estudiozinho no bairro de Neukölln que o Connor e sua banda, o Furious Few, usava para ensaiar até poucos meses atrás, quando tiveram que ceder às reclamações da dona do lugar ("Vocês são muito barulhentos!") e encontrar um estúdio novo.

O nome do disco deu um trabalho do cão: aporrinhei inúmeros amigos com intermináveis brainstorms, eliminei opções como "Eu Nunca", "Molho de Tomate", "Lascado", "Pé na Jaca", "Sem Vergonha", "Quiproquó", "Mais Pra Lá Do Que Pra Cá" e tantas outras, e no fim das contas escolhi Sangria Desatada, que evoca vários temas retratados nas letras do disco, incluindo situações problemáticas ou desesperadas, sangue (doença, hipocondria), bebidas alcóolicas e a cor vermelha, que tinge o entomatado clipe de "Amor Hermético" e também a capa do disco, feita pelos meus chapas Cauê Ferraz (foto) e Daniel de Pinho (layout).

Faixa a faixa, estas são as canções do Sangria Desatada:

1- Samba do Milagre



Lucas Paio: voz, violão, percussão
Connor Fitzgerald: baixo, bateria, percussão
Elissa de Brito e Cauê Ferraz: backing vocals
Gravada em 15 de julho (música toda) e 23 de agosto de 2018 (backing vocals)

Minha amiga Isabella Brandão, doravante apenas Bella, tem um dedo em várias canções deste EP, a começar pela faixa de abertura. Em 2011, quando eu morava na China, tivemos a ideia de um sambinha onde o eu-lírico era um bebum apelando para a religião pra tentar achar o caminho de casa. Acabou virando uma das músicas próprias que eu sempre tocava pelos bares de Beijing.

A gravação contou com os backing vocals de dois brasileiros, a Elissa (mais sobre ela daqui a pouco) e o Cauê, amigo dos tempos da China que pintou em Berlim de supetão e foi logo recrutado para uma porção de tarefas neste disco, incluindo fotografar a capa, ajudar no clipe e emprestar sua voz aos refrões dos dois sambinhas.

2- Amor Hermético



Lucas Paio: voz, violão
Connor Fitzgerald: guitarra, baixo, bateria
Gravada em 27 de junho de 2018

Encerrei o ano passado com uma resolução audaz para 2018: escrever uma música por semana. Tinha tudo pra dar errado. E deu. Mas o começo do ano foi até razoável — compus duas novas canções em janeiro e ambas entraram no EP.

"Amor Hermético" foi a primeira delas, a história de um amor malvisto com menções a filmes incompreensíveis, músicas experimentais e artes bizarras (algumas referências ficaram pelo caminho; não consegui encaixar o verso "É que nem Donnie Darko e aquele coelho", por exemplo).

Acabou virando o primeiro clipe do Sangria Desatada: quando mostrei a demo para umas amigas brasileiras, uma topou atuar (a Fernanda Valdivieso, que tem um perfil no Instagram que você precisa seguir) e a outra pra dirigir (a Elissa de Brito, que já tinha feito um clipe foda para uma amiga nossa em comum, Mariana Bahia). Num brainstorm regado a cervejas, nós três chegamos ao conceito dos tomates como símbolo das críticas alheias, e numa bela segunda-feira de agosto filmamos mais de 1h30min de material: a Fernanda estrelou junto com o americano Evan Harris Foster, a Elissa filmou junto com nosso amigo Flávio Amieiro, e o Cauê também ajudou pacas, inclusive filmando a cena final (em que apareço junto com a Elissa e o Flávio). Passei alguns semanas editando, Elissa e Flávio fizeram a correção de cores e lançamos o clipe mundialmente no YouTube no dia 14 de novembro.

Não viu ainda? Pois veja:



3- Débora



Lucas Paio: voz, violão, guitarra, palmas
Connor Fitzgerald: guitarra, baixo, palmas, percussão, backing vocals, piano
Spike Rogers: bateria, percussão
Gravada em 4 de junho de 2018

A origem dessa música remonta ao longínquo ano de 2006, quando Orkut e MSN ainda reinavam absolutos. Papeando pelas internets com a Bella, ela contou que tinha uma amiga, a Débora, que reclamava por não haver nenhuma música com seu nome porque nada rimava com "Débora". Encarei isso como um desafio pessoal e, embora fosse realmente impossível encontrar o diacho da rima, acabei fazendo um poeminha justamente sobre isso. Levou apenas 12 anos para que os versinhos, agora musicados, ganhassem uma gravação.

"Débora" foi a primeira faixa a ser registrada para o EP, e a única feita de maneira mais "convencional", com três caras tocando violão, baixo e bateria ao mesmo tempo. Além do Connor, a música contou com a participação do também australiano Spike Rogers (colega do Connor no Furious Few) na bateria. Depois de gravarmos a base, fomos adicionando os outros pedaços separadamente, incluindo pandeiro meia-lua e outros objetos percussivos, um solinho de guitarra (valeu Mariana Bahia por emprestar a sua!), palmas, assovios e lalalás.

4- Cantiga do Armagedom


Lucas Paio: voz, violão
Connor Fitzgerald: baixo, bateria
Gravada em 15 de julho (violão + bateria) e 23 de agosto de 2018 (o resto)

Eu já tinha a melodia e a harmonia há muito tempo. Entre as várias tentativas de colocar letra, muitas de quando eu ainda morava no Brasil, havia uma praiana e melancólica...

Não tem mais ninguém no mar
Guardaram todos os guarda-sóis
Ninguém mais corre na areia
E da praia cheia só sobramos nós

...e outra com um protagonista no leito de morte:

Já me deito
Nesse leito
Pensando em outros carnavais

Nem aqui
Na UTI
Escapo de desejos tais

Não consegui ir adiante com nenhuma dessas versões; um dia pensei em escrever sobre o fim do mundo e a coisa fluiu. Isso em 2011, numa época em que "calendário maia" ainda fazia parte do vocabulário popular e o apocalipse estava logo ali na esquina, chegando implacavalmente no dia 21 de dezembro de 2012.

(Fato avulso: perdi a final da Copa da Rússia por causa de "Cantiga do Armagedom". Aconteceu foi que marquei o estúdio com semanas de antecedência e simplesmente esqueci que a final seria no dia 15 de julho. Quando saí do estúdio já estava 2x1 pra França. Fui correndo pra casa de uma amiga ver o finalzinho, mas o placar já tinha ido pra 4x2 quando cheguei e a partida terminou assim. Só deu tempo de ver o Putin protegido da chuva por um segurança enquanto os presidentes da França e da Croácia, ao seu lado, se ensopavam todos.)

5- Será Que Eu Tô Morrendo?



Lucas Paio: voz, violão
Connor Fitzgerald: baixo, bateria, percussão, órgão, piano
Elissa de Brito e Cauê Ferraz: backing vocals
Gravada em 23 de agosto de 2018

Num período especialmente hipocondríaco da minha vida, no início deste ano, fiz uma canção tirando sarro de minhas próprias preocupações coma ajuda da Bella, óia ela aí de novo. Numa conversa virtual, não mais no MSN mas agora no WhatsApp, ela sugeriu um refrão ("A mão latejando / A perna tremendo / Será que tô morrendo?") que deu origem a mais um sambinha, cuja gravação também contou com os amigos Cauê e Elissa cantando o refrão comigo. O Connor ainda adicionou, na casa dele, um órgão de igreja na parte do "A única solução / É a extrema unção" e uns pianinhos espertos no final.

Não ouviu o disco ainda? Pois ouve lá no Spotify!

Não tem Spotify? Tente o Deezer, Apple Music, Google Play...

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Lucas Paio já foi campeão mineiro de aviões de papel, tocou teclado em uma banda cover de Bon Jovi, vestiu-se de ET e ninja num programa de tevê, usou nariz de palhaço no trânsito, comeu gafanhotos na China, foi um rebelde do Distrito 8 no último Jogos Vorazes e um dia já soube o nome de todas as cidades do Acre de cor, mas essas coisas a gente esquece com a idade.

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