Finalmente, a Muralha
Nos tempos de escola, excursões eram coisa corriqueira. Umas boas vezes por ano deixávamos a sala de aula para viagens rápidas a Ouro Preto ou Gruta da Lapinha ou mesmo Sabará. Durante o ensino médio elas escassearam, mas em compensação quando havia uma – como Diamantina e Itamarandiba - era sempre um evento memorável. Na faculdade, claro, acabou a mamata: nada de viagens ou passeios organizados pela reitoria. Eu nem imaginava que em pleno dois mil e nove, formado há três anos, eu voltaria ao mundo das excursões escolares viajando com colegas de todos os cantos do mundo para conhecer a Grande Muralha da China.
Zarpamos às oito da manhã saindo do estacionamento principal da BLCU num ônibus moderno – tinha até microondas (?!) – mas pouco generoso no espaço entre os assentos. No início o clima era de farra e eu até ensinei um israelense da minha sala a cantar "jererê, jererê, ú éle ésse dê", mas depois todo mundo hibernou e acordei com o corpo doído de dormir sentado. Às nove e quarenta e tantas, descemos em Mutianyu.
Como você pode deduzir, a muralha é incomensuravelmente grande e há diversos pontos onde você pode visitá-la. O setor mais famoso – e mais próximo de Beijing – é Badaling, abarrotado de turistas como se esperaria de uma das sete maravilhas do mundo moderno. Mutianyu é um pouco mais distante daqui e é supostamente menos turística, mas não espere encontrar meia dúzia de farofeiros fazendo piquenique, porque menos turístico na China ainda é gente pra burro.
Disse Mao: "aquele que nunca escalou a Grande Muralha não é um homem de verdade". Escalar é força de expressão, porque tudo que você tem que fazer é subir algumas dezenas (tá bom, várias dezenas) de degraus para chegar na muralha propriamente dita. E uma vez lá dentro, é só escolher esquerda ou direita e caminhar até onde seus pés agüentarem, sem aclives ou declives de maiores proporções. No dia em que estivemos lá, tinha até um bebê alemão aprendendo a dar seus primeiros passos no famoso monumento.
A Grande Muralha leva esse nome não por sua altura ou largura, mas por seu comprimento. Essa história de que é a única construção humana que dá pra ver do espaço é uma Grande Balela, porque ela é estreita, apenas alguns passos entre um lado e outro. Em compensação, se estende por milhares de quilômetros e existe até um ponto onde ela encontra o mar. Ouvi falar de um casal britânico que andou a muralha toda, mochilando e acampando. Levaram 167 dias.
O trecho que visitamos é repleto de torres de vigília. Em algumas dá pra subir no topo e tem até vendedores na porta vendendo água, cerveja e Snickers (!!). Da paisagem não preciso me alongar muito: é previsivelmente belíssima, com montanhas por todo lado, e especialmente interessante agora no outono, quando as folhas das árvores mudam de cor. Aí no alto de uma montanha tinha uma inscrição enorme em ideogramas chineses, e fui perguntar à minha professora qual era o significado. Ela respondeu empolgada: "Chairman Mao!". Não dá pra escapar desse cara.
Para descer, tínhamos três opções: voltar a pé pelos mesmos degraus, pegar o teleférico até a base ou descer ladeira abaixo numa espécie de tobogã. Preferimos a opção mais divertida e até nossa l osh entrou na dança. Você sobe num protótipo de carrinho com apenas dois controles – brecar e acelerar – e volta à infância enquanto os guardinhas ao longo da descida gritam desesperadamente pra galera diminuir a velocidade.
O estacionamento de Mutianyu, aonde voltamos depois do tobogã, é na verdade o pedaço mais "turistão", com trocentas lojinhas vendendo bugigangas, leques, chapéus, camisetas escrito "I have climbed the Great Wall", pingentes com seu nome em chinês e todas as tralhas que se espera de um lugar como esse. Esfomeados têm à disposição panquecas, espetinhos e até uma unidade do Subway. Quanto a mim, comprei um chapéu de camponês estilo Rayden do Mortal Kombat, uma aquisição que não me será de muita serventia, mas que eu vinha desejando há algum tempo. Pelo menos, vale pra tirar fotos bizarras.