29/12/2018

Top 15 discos favoritos de 2018


Em 2018, me esforcei para conhecer mais música nova e ouvi cerca de 70 discos lançados este ano. Não foram mais porque resolvi me embrenhar numas maratonas musicais que me tomaram bastante tempo: primeiro, ouvir toda a discografia dos Rolling Stones (foram quase 800 faixas em 1 mês); depois, seguir cronologicamente a lista do livro 1001 Discos Para Ouvir Antes de Morrer (ultrapassei recentemente a marca dos 400, o resto fica pra 2019).

Neste post estão meus 15 discos favoritos do ano, que poderiam ser 20 ou 25 (ficaram de fora Dream Wife, Car Seat Headrest, Soccer Mommy, Lucy Dacus, The Spook School, Long Distance Calling, entre outros). A ordem é alfabética, porque se eu fosse rankear ficaria aqui o dia inteiro e mudaria de ideia dois minutos depois.


André Abujamra  Omindá

Um álbum ambicioso, repleto de convidados, estilos diversos e idiomas mil. Só não desbancou o Mafaro (2010) como o meu favorito do Abujamra. 

Favoritas: “Barulhinho”, “Povo Bonito”, “Real Grandeza”



Baco Exu do Blues  Bluesman

Nunca fui muito de hip hop, mas foi difícil ignorar o disco sensação do momento, seus títulos instigantes como "Me Desculpa Jay Z" e "Kanye West da Bahia", sua mistura de estilos e suas letras espertas.

Favoritas: "Bluesman", "Queima Minha Pele", "Me Desculpa Jay Z"


Courtney Barnett – Tell Me How You Really Feel

A australiana, que poderia ser uma filha perdida de Kurt Cobain e Courtney Love, fez um sucessor à altura do seu disco de estreia, Sometimes I Sit and Think, and Sometimes I Just Sit (2015).

Favoritas: "City Looks Pretty", "Charity", "Nameless, Faceless"


Dave Matthews Band – Come Tomorrow

Depois de seis anos de hiato, a Banda do Davi Mateus voltou com um trabalho foda, talvez o meu favorito deles desde o Before These Crowded Streets (1998).

Favoritas: "Samurai Cop (Oh Joy Begin", "That Girl Is You", "Idea of You", "Black and Blue Bird", "Come On Come On"


Dirty Projectors – Lamp Lit Prose

Riffs imprevisíveis e harmonias vocais complicadas que seguem o estilo dos ótimos Bitte Orca (2009) e Swing Lo Magellan (2012).

Favoritas: "Break-Thru", "Right Now", "That's A Lifestyle"


Eels – The Deconstruction

Rock sem firulas da banda capitaneada pelo multi-instrumentista "E", que descobri há quase uma década com o simpático Hombre Lobo (2009).

Favoritas: "The Deconstruction", "Bone Dry", "Today Is The Day"


Elza Soares – Deus É Mulher

Depois de A Mulher do Fim do Mundo (2016), Elza (já octogenária!) continua a ótima fase com seus vocais rasgados cantando letras desavergonhadas e atuais.

Favoritas: "O Que Se Cala", "Banho", "Eu Quero Comer Você"


Ezra Furman – Transangelic Exodus

Clima oitentista, boas melodias e letras raivosas e sinceras.

Favoritas: "Suck the Blood From My Wound", "I Lost My Innocence", "Driving Down to L.A."


Field Music – Open Here

Com suas flautinhas e harmonias vocais à la Crosby, Stills & Nash, se falassem que este era um disco dos anos 70 perdido num vórtex temporal e encontrado em 2018, eu acreditaria. Provavelmente está no meu top 3 deste ano.

Favoritas: "Open Here", "Time in Joy", "Share a Pillow", "Daylight Saving", "Find a Way to Keep Me"


The Go! Team – Semicircle

Pop-indie-rock feliz e com clima de verão.

Favoritas: "Mayday", "Semicircle Song", "Hey!", "All the Way Live"


Luísa Mitre – Oferenda

Música instrumental brasileira com melodias e arranjos excelentes. E não estou falando só porque é minha prima: a Folha e o Yamandu Costa também estão de acordo.

Favoritas: "A Fuga do Tatu", "Chegada", "Rodeando"


Mitski – Be the Cowboy

Este ficou em primeiro lugar na lista de melhores do ano da Pitchfork, o que me deixou meio ressabiado, já que nosso gosto não anda batendo já faz tempo. A capa e o single "Nobody" enganam, mas este é um discaço de rock.

Favoritas: "Geyser", "A Pearl", "Me and My Husband"


The Smashing Pumpkins – Shiny and Oh So Bright, Vol. 1 / LP: No Past. No Future. No Sun.

Billy Corgan e seus Abóboras Amassadas voltaram em 2018 com um disco simpático e cantável que, se não é lá muito inovador, tampouco faz feio frente aos tempos áureos da banda nos anos 90. 

Favoritas: "Solana", "Silvery Sometimes (Ghosts)", "Knights of Malta"


Tony Molina – Kill The Lights

O californiano é conhecido por suas microcanções: aqui, são dez faixas que totalizam 14 minutos, lembrando o lado B de Abbey Road e sua vibe de canções-que-acabam-quando-você-acha-que-estão-começando. As melodias, aliás, são bem beatleanianas.

Favoritas: “Jasper’s Theme”, “Now That She’s Gone”, “Look Inside Your Mind / Losin’ Touch”, “Before You Go”


Yamantaka // Sonic Titan – Dirt

Meio rock, meio prog-metal, bastante experimental e deveras interessante.

Favoritas: "Yandere", "Dark Waters", "Out of Time"


Bônus:
The Beatles - Álbum Branco - Edição especial de 50 anos

Talvez o meu disco favorito dos liverpudlianos (numa eterna disputa com Abbey Road), o Álbum Branco virou cinquentão e celebrou com uma edição especial supimpa: são 6 CDs, incluindo uma nova mixagem do disco original, as famosas Esher Demos e mais uma pá de takes, ensaios e versões alternativas. Melhor que isso só o livrão que vem junto, contendo os bastidores das gravações, minúcias de cada faixa e manuscritos originais, com correções e tudo mais.

Favoritas: o take de 10 minutos de “Revolution 1”, a versão embrionária de “Let It Be”, o primeiro take de “Hey Jude”, a versão completa de “Can You Take Me Back?” (da qual só um trechinho entrou no disco, ao final de “Cry Baby Cry”)

16/12/2018

Sangria Desatada, faixa a faixa


Lancei um disco.

Na verdade não é bem um diiiiisco, um álbum inteiro, e sim um EP (S.m., do inglês Extended Play. Uma gravação musical longa demais para ser considerada um single e curta demais para ser classificada como um álbum; geralmente possui de 4 a 6 faixas). Já fazia um bom tempo que eu queria gravar algumas composições próprias: nos últimos 10 anos, as únicas músicas que registrei sonoramente tinham sido o single "Pequena Morsa / Festa Junina em Banheiro" (2009), com minha banda ABUNN, e a música-tema do curta A Menina Que Comia Música (2015).


Em 2018 resolvi criar vergonha na cara e tirar algumas canções da famigerada gaveta de projetos inacabados. Primeiro gravei demos caseiras, que mandei pros amigos em busca de feedbacks. A intenção era achar um estúdio e gravar tudo em esquema voz e violão, simplezão mesmo. Mas aí, através de um amigo, conheci o Connor, um músico australiano que também mora em Berlim e não só se dispôs a gravar e mixar as 5 músicas, como também ofereceu seus talentos de multi-instrumentista e tocou de tudo, incluindo bateria, baixo, guitarra, piano e percussão.

Foram 4 sessões, espalhadas ao longo do verão europeu, num estudiozinho no bairro de Neukölln que o Connor e sua banda, o Furious Few, usava para ensaiar até poucos meses atrás, quando tiveram que ceder às reclamações da dona do lugar ("Vocês são muito barulhentos!") e encontrar um estúdio novo.

O nome do disco deu um trabalho do cão: aporrinhei inúmeros amigos com intermináveis brainstorms, eliminei opções como "Eu Nunca", "Molho de Tomate", "Lascado", "Pé na Jaca", "Sem Vergonha", "Quiproquó", "Mais Pra Lá Do Que Pra Cá" e tantas outras, e no fim das contas escolhi Sangria Desatada, que evoca vários temas retratados nas letras do disco, incluindo situações problemáticas ou desesperadas, sangue (doença, hipocondria), bebidas alcóolicas e a cor vermelha, que tinge o entomatado clipe de "Amor Hermético" e também a capa do disco, feita pelos meus chapas Cauê Ferraz (foto) e Daniel de Pinho (layout).

Faixa a faixa, estas são as canções do Sangria Desatada:

1- Samba do Milagre



Lucas Paio: voz, violão, percussão
Connor Fitzgerald: baixo, bateria, percussão
Elissa de Brito e Cauê Ferraz: backing vocals
Gravada em 15 de julho (música toda) e 23 de agosto de 2018 (backing vocals)

Minha amiga Isabella Brandão, doravante apenas Bella, tem um dedo em várias canções deste EP, a começar pela faixa de abertura. Em 2011, quando eu morava na China, tivemos a ideia de um sambinha onde o eu-lírico era um bebum apelando para a religião pra tentar achar o caminho de casa. Acabou virando uma das músicas próprias que eu sempre tocava pelos bares de Beijing.

A gravação contou com os backing vocals de dois brasileiros, a Elissa (mais sobre ela daqui a pouco) e o Cauê, amigo dos tempos da China que pintou em Berlim de supetão e foi logo recrutado para uma porção de tarefas neste disco, incluindo fotografar a capa, ajudar no clipe e emprestar sua voz aos refrões dos dois sambinhas.

2- Amor Hermético



Lucas Paio: voz, violão
Connor Fitzgerald: guitarra, baixo, bateria
Gravada em 27 de junho de 2018

Encerrei o ano passado com uma resolução audaz para 2018: escrever uma música por semana. Tinha tudo pra dar errado. E deu. Mas o começo do ano foi até razoável — compus duas novas canções em janeiro e ambas entraram no EP.

"Amor Hermético" foi a primeira delas, a história de um amor malvisto com menções a filmes incompreensíveis, músicas experimentais e artes bizarras (algumas referências ficaram pelo caminho; não consegui encaixar o verso "É que nem Donnie Darko e aquele coelho", por exemplo).

Acabou virando o primeiro clipe do Sangria Desatada: quando mostrei a demo para umas amigas brasileiras, uma topou atuar (a Fernanda Valdivieso, que tem um perfil no Instagram que você precisa seguir) e a outra pra dirigir (a Elissa de Brito, que já tinha feito um clipe foda para uma amiga nossa em comum, Mariana Bahia). Num brainstorm regado a cervejas, nós três chegamos ao conceito dos tomates como símbolo das críticas alheias, e numa bela segunda-feira de agosto filmamos mais de 1h30min de material: a Fernanda estrelou junto com o americano Evan Harris Foster, a Elissa filmou junto com nosso amigo Flávio Amieiro, e o Cauê também ajudou pacas, inclusive filmando a cena final (em que apareço junto com a Elissa e o Flávio). Passei alguns semanas editando, Elissa e Flávio fizeram a correção de cores e lançamos o clipe mundialmente no YouTube no dia 14 de novembro.

Não viu ainda? Pois veja:



3- Débora



Lucas Paio: voz, violão, guitarra, palmas
Connor Fitzgerald: guitarra, baixo, palmas, percussão, backing vocals, piano
Spike Rogers: bateria, percussão
Gravada em 4 de junho de 2018

A origem dessa música remonta ao longínquo ano de 2006, quando Orkut e MSN ainda reinavam absolutos. Papeando pelas internets com a Bella, ela contou que tinha uma amiga, a Débora, que reclamava por não haver nenhuma música com seu nome porque nada rimava com "Débora". Encarei isso como um desafio pessoal e, embora fosse realmente impossível encontrar o diacho da rima, acabei fazendo um poeminha justamente sobre isso. Levou apenas 12 anos para que os versinhos, agora musicados, ganhassem uma gravação.

"Débora" foi a primeira faixa a ser registrada para o EP, e a única feita de maneira mais "convencional", com três caras tocando violão, baixo e bateria ao mesmo tempo. Além do Connor, a música contou com a participação do também australiano Spike Rogers (colega do Connor no Furious Few) na bateria. Depois de gravarmos a base, fomos adicionando os outros pedaços separadamente, incluindo pandeiro meia-lua e outros objetos percussivos, um solinho de guitarra (valeu Mariana Bahia por emprestar a sua!), palmas, assovios e lalalás.

4- Cantiga do Armagedom


Lucas Paio: voz, violão
Connor Fitzgerald: baixo, bateria
Gravada em 15 de julho (violão + bateria) e 23 de agosto de 2018 (o resto)

Eu já tinha a melodia e a harmonia há muito tempo. Entre as várias tentativas de colocar letra, muitas de quando eu ainda morava no Brasil, havia uma praiana e melancólica...

Não tem mais ninguém no mar
Guardaram todos os guarda-sóis
Ninguém mais corre na areia
E da praia cheia só sobramos nós

...e outra com um protagonista no leito de morte:

Já me deito
Nesse leito
Pensando em outros carnavais

Nem aqui
Na UTI
Escapo de desejos tais

Não consegui ir adiante com nenhuma dessas versões; um dia pensei em escrever sobre o fim do mundo e a coisa fluiu. Isso em 2011, numa época em que "calendário maia" ainda fazia parte do vocabulário popular e o apocalipse estava logo ali na esquina, chegando implacavalmente no dia 21 de dezembro de 2012.

(Fato avulso: perdi a final da Copa da Rússia por causa de "Cantiga do Armagedom". Aconteceu foi que marquei o estúdio com semanas de antecedência e simplesmente esqueci que a final seria no dia 15 de julho. Quando saí do estúdio já estava 2x1 pra França. Fui correndo pra casa de uma amiga ver o finalzinho, mas o placar já tinha ido pra 4x2 quando cheguei e a partida terminou assim. Só deu tempo de ver o Putin protegido da chuva por um segurança enquanto os presidentes da França e da Croácia, ao seu lado, se ensopavam todos.)

5- Será Que Eu Tô Morrendo?



Lucas Paio: voz, violão
Connor Fitzgerald: baixo, bateria, percussão, órgão, piano
Elissa de Brito e Cauê Ferraz: backing vocals
Gravada em 23 de agosto de 2018

Num período especialmente hipocondríaco da minha vida, no início deste ano, fiz uma canção tirando sarro de minhas próprias preocupações coma ajuda da Bella, óia ela aí de novo. Numa conversa virtual, não mais no MSN mas agora no WhatsApp, ela sugeriu um refrão ("A mão latejando / A perna tremendo / Será que tô morrendo?") que deu origem a mais um sambinha, cuja gravação também contou com os amigos Cauê e Elissa cantando o refrão comigo. O Connor ainda adicionou, na casa dele, um órgão de igreja na parte do "A única solução / É a extrema unção" e uns pianinhos espertos no final.

Não ouviu o disco ainda? Pois ouve lá no Spotify!

Não tem Spotify? Tente o Deezer, Apple Music, Google Play...

Quem

Lucas Paio já foi campeão mineiro de aviões de papel, tocou teclado em uma banda cover de Bon Jovi, vestiu-se de ET e ninja num programa de tevê, usou nariz de palhaço no trânsito, comeu gafanhotos na China, foi um rebelde do Distrito 8 no último Jogos Vorazes e um dia já soube o nome de todas as cidades do Acre de cor, mas essas coisas a gente esquece com a idade.

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