Percebi que tinha me adaptado às terras germânicas no dia em que me vi na fila do supermercado comprando um livrinho só com receitas de aspargos.
Os alemães são absolutamente fissurados com aspargos. Quando chega a primavera, todos os restaurantes anunciam cardápios especiais só com receitas de aspargos, os supermercados os colocam em posição proeminente nas gôndolas e as buscas no Google por "Spargel" – como o vegetal é conhecido na língua de Goethe – atingem seu pico anual. No gráfico abaixo, compare com as pesquisas por "Kartoffel" (batata), outra notória paixão alemã.
Parte do apelo é a sazonalidade: é um vegetal disponível por tempo limitado, coisa de dois meses apenas. Quando chega junho, acabou-se o que era aspargo, e depois só no ano que vem. E é tão popular que nem sempre a oferta dá conta da demanda. Outro dia mesmo deixei pra ir no supermercado às três da tarde e não tinha mais aspargos verdes. Certamente deve haver algum ditado alemão do tipo "Deus ajuda quem cedo madruga", mas usando aspargos como analogia.
Tanto os aspargos brancos quanto os verdes pertencem à mesma espécie, o Asparagus officinalis. Os brancos são os preferidos dos alemães, geralmente cozido e degustado com molho holandês (feito com manteiga e gema de ovo) e acompanhando um bom Schnitzel. Em 2021, o McDonald's alemão criou até um hambúrguer com aspargos brancos e molho holandês (que não deve ter feito sucesso, pois já saiu de linha). Acho que um pacotinho vermelho de fritas, com aspargos verdes no lugar das batatinhas, seria um méqui-petisco mais gostoso, mas enfim.
Os aspargos verdes são mais versáteis: dá pra refogar, cozinhar, assar, grelhar. E são mais fáceis de fazer do que os brancos, porque você não precisa descascá-los, só quebrar a ponta de baixo, mais dura e madeirosa. São os meus preferidos, não só pela conveniência, mas pelo sabor mesmo.
No Brasil dá até pra encontrar aspargos em alguns supermercados, mas é tipo um vegetal lado B, que muita gente nunca comeu. Uma vez, visitando Beagá, fui convidado para um churrasquinho e levei, todo contente, um punhado de aspargos verdes que achei no Verdemar. Teve gente que olhou e perguntou: "o que é isso?".
Daqui a poucas semanas os aspargos vão sumir das gôndolas, mas enquanto isso sigo aproveitando o
Spargelzeit – "época dos aspargos" – em qualquer oportunidade. O livrinho de receitas que comprei há quatro anos, inclusive, já foi usado várias vezes, junto com receitas variadas da internet e improvisos caseiros. Olha aí alguns exemplos que não me deixam mentir:
Aspargos ao forno, enrolados em fatias de abobrinha e queijo fresco:
Aspargos com cuscuz e morangos:
Aspargos acompanhando um franguinho improvisado com tomates e cebolas:
Aspargos, ervilhas e outros legumes com tempero indiano acompanhando salmão:
Aspargos com salmão e purê de ervilhas:
Aspargos com almôndegas, sementes de romã e um creme que não lembro mais do que era feito: