To infinity – and beyond
Quando fui ver Toy Story nos cinemas, o primeiro longa totalmente animado em computador era só o novo filme da Disney. Claro, era totalmente animado em computador e, com exceção dos personagens humanos ainda rudimentares, tinha um visual impecável. Mas para um moleque de 11 anos acostumado a assistir todas as férias a um novo desenho da Disney, pouco importava se a aventura de Woody e Buzz fora realizada por um outro estúdio, já que seguia a bem-sucedida seqüência de sucessos da empresa do tio Walt nos anos 90.
Alguns anos depois, ignorei solenemente a estréia de Vida de Inseto nos cinemas, bem como a de seu rival temático Formiguinhaz. Os insetos que brigassem pra lá, que eu não tinha nada com aquilo. Toy Story 2 também não me interessou, gato escaldado que eu estava de seqüências oportunistas, e os seguintes Monstros S.A. e Procurando Nemo só fui conferir tardiamente em DVD.
O que faz um filme da Pixar ser um filme da Pixar?
Toy Story (1995), direção de John Lasseter
E se os brinquedos ganhassem vida quando ninguém estivesse olhando? A premissa simples põe na tela o cowboy Woody e o astronauta Buzz Lightyear, este último responsável pelo clássico bordão “Ao infinito... e além!” – que poderia fácil ser o lema da Pixar.
Coisas que você não sabia: cada frame do filme levou de 4 a 13 horas pra renderizar; Buzz foi batizado em homenagem a Buzz Aldrin, segundo homem a pisar na Lua.
Vida de Inseto (1998), direção de John Lasseter, co-direção de Andrew Stanton
“Um épico de minúsculas proporções”, diz o slogan do filme. Narrando a saga da formiga Flick e sua missão de salvar a colônia da opressão dos gafanhotos, Vida de Inseto traz ainda um excelente elenco de apoio que não fica só na formigaiada – pulgas, bichos-paus e até um “joaninho” macho também dão as caras e as patas.
Coisas que você não sabia: o “trem” do circo de insetos é feito de caixas de biscoitos da marca Casey Jr., o mesmo nome do trem do circo de Dumbo; o carro do Pizza Planet, de Toy Story, aparece neste filme e em todos os outros feitos pela Pixar depois.
Toy Story 2 (1999), direção de John Lasseter, co-direção de Ash Brannon e Lee Unkrich
Os papéis do primeiro filme se invertem quando Woody é roubado por um colecionador e Buzz lidera uma operação de resgate. Tão bom quanto o primeiro, ainda tem a vantagem de quatro anos de evolução técnica a mais.
Coisas que você não sabia: foi feito pra ser lançado direto em vídeo, mas as primeiras cenas ficaram tão legais que decidiram exibir no cinema; o pingüim Wheezy é um tributo ao mascote do Linux.
Monstros S.A. (2001), direção de Pete Docter, co-direção de David Silverman e Lee Unkrich
Se antes mostraram a vida secreta dos brinquedos e dos insetos, desta vez são os monstros de armário que têm o cotidiano escancarado. Ficamos sabendo, assim, que é o grito das crianças ao serem assustadas pelas criaturas que garante a energia de Monstrópolis. Um pouco subestimado por ter sido lançado na mesma época que Shrek, é, no entanto, igualmente criativo e divertido.
Coisas que você não sabia: a dubladora da menina Boo era tão pequena que era praticamente impossível que ela ficasse quieta pra gravar suas falas. Ao invés disso, eles simplesmente a seguiam com um microfone enquanto ela brincava e depois selecionavam os melhores trechos.
Procurando Nemo (2003), direção de Andrew Stanton, co-direção de Lee Unkrich
Um road-movie no mar. Procurando Nemo se passa na Grande Barreira de Corais australiana, onde um pai parte em busca de seu filho perdido; o detalhe é que os dois são peixes-palhaços. Embora não seja tão bem amarrado quanto os anteriores, o filme capricha nos coadjuvantes, como a desmemoriada Dory e as baleias que falam baleiês. Acho que esse desenho é mais preferido por mulheres, mas pode ser impressão minha.
Coisas que você não sabia: todos os peixes mostrados existem de verdade, e há uma ala especial no aquário de Sydney só com espécimes do filme; a equipe criou uma textura aquática tão realista que tiveram de piorá-la um pouco, pra que ninguém pensasse que tinha sido filmado no fundo do mar; em latim, “nemo” significa “ninguém”.
Os Incríveis (2004), direção de Brad Bird
Brad Bird, responsável pela desconhecida e excelente animação (2D) O Gigante de Ferro, faz sua estréia na direção de um longa da Pixar. E que estréia: misturando Watchmen com o Quarteto Fantástico, Bird traz os super-heróis ao mundo real em grande estilo, contando até com uma trilha de jazz à la James Bond.
Coisas que você não sabia: o vilão Síndrome originalmente ia se chamar Xerek; o nome do filme seria “Os Invencíveis”; o próprio Brad Bird dublou a estilista Edna Mode e inspirou as feições do Síndrome.
Carros (2006), direção de John Lasseter, co-direção de Joe Ranft
O mais fraco dos nove filmes da Pixar é, ainda assim, um excelente entretenimento. John Lasseter leva à animação o mundo automobilístico e a Rota 66, seguindo a linha seres-não-humanos-vivendo-em-sociedade. Se os personagens não têm tanto carisma quanto um Woody ou um Sr. Incrível, as piadas compensam, principalmente as gags visuais.
Coisas que você não sabia: Michael Schumacher faz uma ponta dublando uma Ferrari; os animadores desenharam mais de 43 mil esboços de carros; o nome do filme seria “Rota 66”, mas foi modificado para evitar confusões com a série dos anos 60 de mesmo nome.
Ratatouille (2007), direção de Brad Bird, co-direção de Jan Pinkava
Quando vi o trailer não me animei (“ah não, mais um filme de rato”), e pensei que a Pixar fosse finalmente errar a mão, depois da ligeira decepção com Carros. Graças a Deus, estava enganado. Ratatouille não é só o melhor filme da Pixar: é uma das melhores animações de todos os tempos, uma ode à arte, impecável do início ao fim, principalmente no fim. O monólogo do crítico gastronômico Anton Ego ainda me arrepia, mesmo revendo exaustivamente em DVD.
Coisas que você não sabia: centenas de pratos foram cuidadosamente preparados e fotografados para servir de referência; Linguini mora no bairro parisiense de Montmartre, o mesmo de Amélie Poulain; o ratatouille preparado por Remy é a variante conhecida como confit byaldi, caso você queira pedir ao maître num restaurante francês.
Pixar Short Films (1984-2007)
Este DVD, lançado ano passado, reúne todos os curtas produzidos pelo estúdio até 2007. O grande destaque é mesmo Luxo Jr.: a história da luminária-pai e a luminária-filho foi feita nos longínquos anos 80 e ainda impressiona, utilizando limitações (como o fundo preto) a seu favor. Alguns curtas lá do início não têm tanta graça, bem como Mater and the Ghostlight, que usa os personagens de Carros. Mas tem muita coisa boa: Red’s Dream e sua atmosfera noir, For The Birds, One Man Band... Sem falar no excelente documentário sobre a história da Pixar.
Foi com grande expectativa, portanto, que acompanhei a pré-produção de WALL•E pela internet. O primeiro teaser já era instigante: contava a história do almoço em que os fundadores da Pixar se reuniram após Toy Story para discutir os próximos filmes da empresa. Desse almoço nasceram as idéias de Vida de Inseto, Monstros S.A., Procurando Nemo e este WALL•E. Uma refeição deveras produtiva, há que se dizer.
Foi batata: o robozinho que limpava o lixo da humanidade no ano 2700 ao som de “Aquarela do Brasil” conquistou público e crítica já nos trailers. A expressão profunda que ele conseguia só no olhar, sem boca ou falas, fez chover gente que o comparava ao E.T. de Spielberg ou ao Carlitos de Charles Chaplin. Eleito o quarto lugar da minha lista de filmes mais esperados de 2008 (atrás apenas de Indiana Jones, que decepcionou, Blindness e o novo Batman, de quem espero muito), WALL•E já tinha cheiro de sucesso – e quando digo sucesso, não falo de bilheteria, mas de um filme digno de suceder Ratatouille.
Resumindo a história: assisti WALL•E duas vezes este fim-de-semana, e não me arrependo nem um pouco. É uma lição de como uma trama não precisa ser complexa para ser boa; de como um roteiro não precisa ser verborrágico para divertir ou emocionar. A ausência de diálogos na primeira metade do filme é coisa que pouco diretor hoje em dia tem coragem de fazer. Certas cenas já nascem antológicas, como a dança de WALL•E e EVA no espaço, e até os créditos finais (ao som de uma belíssima canção de Peter Gabriel, “Down to Earth”) servem à narrativa tanto quanto à arte.
Hungry for more
Depois de nove empreitadas de sucesso, o que esperar da Pixar nos próximos anos?
Muito. A Disney e a Pixar divulgaram recentemente uma lista com seus projetos até 2012, entre eles versões recauchutadas em 3D de Toy Story 1 e 2, para 2009 e 2010.
Up, direção de Pete Docter e Bob Peterson, estréia em maio de 2009
Daqui a menos de um ano veremos a história de Carl Fredricksen, que aos 78 anos decide explorar o mundo ao lado de um jovem guarda-florestal. Comparações com Dom Quixote não são totalmente infundadas.
Toy Story 3, direção de Lee Unkrich, estréia em junho de 2010
A história ainda é um mistério, mas já andam falando num Andy que vai pra faculdade e resolve doar os seus brinquedos. Partes 3 costumam ser a pior da trilogia (Homem-Aranha 3, Shrek 3, Piratas do Caribe 3, você entendeu), mas o roteiro está sendo escrito pelo roteirista de Pequena Miss Sunshine, o que é sempre um bom sinal.
Newt, direção de Gary Rydstrom, estréia na metade de 2011
O último lagartixa-de-pé-azul macho e a última lagartixa-de-pé-azul fêmea se odeiam, mas são obrigados a se reproduzir para salvar a espécie. Se precisarem de idéias para coisas para se fazer com uma colher e uma lagartixa-de-pé-azul, posso ajudar.
The Bear and the Bow, direção de Brenda Chapman, estréia no Natal de 2011
A Pixar se aventura nos contos de fada num cenário na Escócia medieval, quando a geniosa Merida, filha da nobreza, prefere se tornar arqueira a conviver com os chatos de sangue azul.
Carros 2, direção de Brad Lewis, estréia na metade de 2012
Lightning McQueen e seu parceiro Mate participam de uma nova competição, aprontando altas confusões com uma turminha de carros da pesada. De todos os projetos anunciados, é o que menos me empolga, mas mantenho a fé, que a fé não costuma falhar.
O brilhante monólogo de Anton Ego no final de Ratatouille termina com uma promessa do velho crítico: “I will be returning to Gusteau’s soon, hungry for more”. Felizmente é assim que me sinto sempre, ao me preparar para assistir um filme feito por quem é apaixonado pelo cinema. Sempre ávido por mais.
Pra você que leu até o final:
Referências de filmes da Pixar em outros filmes da Pixar
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