12/04/2011

Boooom apetiteeee, Vietnãããã!

Minha primeira refeição em Beijing - logo quando cheguei na China , há um ano e meio - foi num restaurante vietnamita. Ele fica num shopping center não muito longe da minha casa, e tornou-se, desde então, um dos meus favoritos. Comida leve, bem temperada, rolinhos primavera sem aquela gordurada, muito camarão. 
 

Meu estômago chegou cheio de expectativa no Vietnã. E meu bolso também: a fama de Hanói é de uma "street food" de qualidade e com precinhos camaradas. Depois de táxi, ônibus, avião, aeroporto, mais avião, mais aeroporto, alfândega e van para o hotel, não importava que já fossem 2 da manhã: era ano-novo vietnamita, bora celebrar com uma cervejinha e quiçá uns quitutes. 

Acompanhados por um casal (ele americano, ela russa de família mongol), adentramos uma ruela cheia de vietnamitas em confraternização gastronômica e escolhemos uma mesinha. Ou deveria dizer "mesícula"? Os bares nas calçadas de Hanói dão a impressão de uma amálgama entre Belo Horizonte e a Vila dos Hobbits, com aquelas mesinhas e banquinhos de criança. Pra acompanhar o suco de cevada (Bia Hanoi), encomendamos uma porção de carne com coisas, como estavam fazendo ao nosso redor. 



 

Tava supimpa. No melhor estilo churrasquinho coreano, tínhamos um mini-fogareiro e fritamos a carne picada na chapa, com manteiga e pãozinho de sal, alinamesa. Na hora da conta é que ficamos desconfiados: tudo bem que a porção era generosa, mas sabemos o preço de uma comida de rua em Beijing - que, em tese, é uma cidade mais cara que Hanói - e nossa conta extrapolava todas as nossas estimativas. Como o lugar sequer tinha cardápio e não sabíamos uma palavra de vietnamita, pagamos e deixamos pra lá. 

Nossas suspeitas continuaram nas refeições subseqüentes. Encontramos um restaurante de calçada, que servia um prato único - sopa de frango e uma gelequinha feita de arroz. 

 
A cobertura parece serragem, mas é só cebola assada. 

Ao contrário do bife na chapa, este não estava extraordinariamente apetitoso, tampouco abundante. Novamente, nada de cardápios ou preços registrados em papel: pedimos a conta, olharam pra nossa cara de gringo e lascaram o valor que acharam melhor. 

 

O exemplo mais claro de como os preços para estrangeiros não eram muito transparentes: comprei um sanduíche estilo x-tudo numa barraquinha de rua (pão francês, queijo, ovo, carne, patês), e me cobraram 20.000 dongs (R$ 1,50). Voltei à MESMA barraquinha, no MESMO dia, pedi o MESMO sanduíche e a atendente - que agora era outra - me cobrou 30.000 dongs. Um aumento de 50% em apenas algumas horas. 

 
E ainda embrulhou no jornal de ontem. Por esse preço, quero notícia fresca! 

Daí em diante, abrimos o Lonely Planet e começamos a ir atrás dos restaurantes indicados no guia. E surpresa: embora tivessem cardápio bem mais eclético, mesas em tamanho natural e comida excelente, os preços eram apenas ligeiramente mais altos do que as comidas de rua, comprovando a furação de olho a que estávamos sendo submetidos. Prefiro pagar um pouco mais, mas como todos os clientes do lugar, do que saber que estou sendo deliberadamente sacaneado. 

E as comidas eram jóia: 

Salada de manga, alface e peito de frango...


...macarrão de arroz com camarão e vegetais...


...rolinhos fritos de carne de porco...


...carne de boi com molhinho bacanudo (devia ter anotado o nome)...


...rolinhos primavera com papel de arroz e recheio de camarão...


...comida com carinha de monstro.
 

A parte líquida também não ficava atrás: de sucos feitos na hora (na foto, manga e melancia)...


...a licores de tudo quanto é tipo de fruta.
 

 
Recomendado por Lonely Planet, Le Routard e "muito livro". 

Três restaurantes, particularmente, eu gostei pacas - se por acaso você for em Hanói, anote os nomes: Highway 4, Little Hanoi e 69 Bar-Restaurant (esse é fácil de lembrar). Este último, especialmente, tinha um monte de pratos no estilo faça-você-mesmo, o que sempre me agrada. Como esse peixe assado na brasa, que depois você misturava ao esbranquiçado macarrão de arroz: 

 

 

Ou este rolinho primavera vietnamita, que incluía papel de arroz, amendoim, camarão enrolado na cana-de-açúcar (mas a cana não é pra comer), ervinhas sortidas, raízes avulsas. 

 

08/04/2011

A cara do Vietnã

Muitas coisas ficam na memória depois de uma viagem ao Vietnã. A comida é uma delas – mas a ótima cozinha vietnamita merece um post solo. Neste aqui, quero focar em cinco itens bem freqüentes durante os meus dias em Hanói: aqueles que, para mim, representam a cara do Vietnã.

Vou de moto 

O que a China tem de bicicleta, o Vietnã tem de moto. A trilha sonora de Hanói é uma incessante sinfonia de zunidos e roncos de motor. Os sinais de trânsito são mera decoração, mas, curiosamente, tive menos problemas para atravessar a rua lá do que em Beijing. Na China, tenho sempre a impressão de que, se não sair correndo, motociclistas e motoristas tampouco farão muito esforço para desviar. Os vietnamitas me pareceram mais escolados, e era só manter um andar constante, sem apressar o passo de repente, que as motos iam às dúzias pra direita, pra esquerda ou pra onde fosse mais conveniente, sem tirar lasca dos transeuntes.

 

As motos no Vietnã raramente trazem só o piloto. O mais comum é encontrar um sujeito no guidom e outro na garupa, ou mesmo três adultos numa mesma motoca. Também não é dificíl ver uma moto com quatro ocupantes, mas aí é geralmente uma família – pai, mãe e duas crianças – passeando sobre duas rodas. Enquanto isso, as bicicletas desfrutam de pouquíssimo prestígio: contei umas seis ou sete durante toda a viagem. 

 
Três pra cá... 


 
...quatro pra lá.

 
Na falta de uma espreguiçadeira, vai de moto. 
 
Tem até bichano esperando pra andar na garupa. 


 
Rei Midas passou por aqui. 

A língua vietnamita 

Chuc mung nam moi! ". Taí uma frase em vietnamita que vou custar a esquecer. Aprendi com o capítulo do guia Lonely Planet sobre o festival Tet, o ano-novo vietnamita. Como chegaríamos lá exatamente no primeiro dia do novo ano lunar, nada melhor do que aprender como dizer "feliz ano-novo!" na língua local pra fazer um agrado. Daí em diante, foi " chuc mung nam moi " a torto e a direito: usávamos a frase pra cumprimentar, agradecer, congratular, e a encontrávamos em zilhões de faixas e cartazes de reveillón espalhadas pela cidade. 

 

 

O vietnamita é uma língua tonal, como o mandarim, o cantonês e o tailandês. Significa que uma ligeira mudança na entonação pode mudar totalmente o sentido do que você quer dizer. " Mo " é "sonho" ou "sepultura", dependendo do tom. Para representar graficamente essa semi-cantoria, entupiram o alfabeto de simbolozinhos: uma letra pode ter acento agudo, acento circunflexo, til, pontinho embaixo, chapeuzinho de cabeça pra baixo, ou vários desses ao mesmo tempo. Por isso, a frase de ano-novo não é simplesmente "chuc mung nam moi", assim pelada, sem adornos. É " chúc mừng năm mới ". Vietnã e Hanói, em vietnamita, escrevem-se Việt Nam Hà Nội 

Todos esses sinais podem confundir os incautos, mas particularmente achei um barato, e infinitamente mais intuitivo do que os ideogramas chineses (que os vietnamitas já usaram, durante os vários séculos de dominação chinesa). Para os circuitos turísticos no Vietnã, dá pra se virar bem com o inglês. Muitos nativos também falam francês, uma das influências da colonização francesa no país entre os séculos 19 e 20 (a abundância de pãezinhos, baguetes e croissants é outra). 


Embora extintos do idioma vietnamita há séculos, os ideogramas chineses sobrevivem na caligrafia artística das ruas. 


 
Quer um leite com "sô cô la"? 


 
Tem uma loira na saída? Não exatamente: "loi ra" é a palavra vietnamita para "saída". 


 
No Vietnã, nosso país virou "Braxin". Os nomes das cidades são geniais: "Bêlô Ôridôntê", "Riô dê Gianêrô", "Xao Paolô", "Xanvado"... 

Além de "feliz ano-novo", a única outra expressão que consigo lembrar em vietnamita é " hai bia ", que significa "duas cervejas". 

 

Chapéus cônicos 

Chamados de dou li na China ("chapéu de bambu"), os chapéus cônicos também são a cara do Vietnã, e ainda mais comuns por lá. O nome vietnamita é nón lá ("chapéu de folha"). 

 
E os jogadores de videogame o conhecem como "chapeuzinho do Raiden". 

Na China é mais difícil encontrá-los na "vida real" – eles estão sempre é nas lojinhas de souvenir, e foi numa delas, em plena Muralha, que comprei o meu . No Vietnã, é fácil avistá-los não apenas nos cocurutos de vendedores nas áreas turísticas, mas em cabeças camponesas nas plantações fora da zona urbana, que é pra onde eles foram criados em primeiro lugar. 

 
Lembra o que eu falei sobre os pãezinhos franceses? 

 
Tem cone para todos os crânios. 

 

 

Show do milhão 

Quer ser um milionário? Vá para o Vietnã. O dong vietnamita (ou đồng ) tem tantos zeros que lembra os nossos cruzeiros e cruzados novos dos anos 1980 e 1990. Eles não valem muito: com R$ 77,00 você já tem um milhão de dongs. Com um salário mínimo brasileiro, pode se gabar de ser multimilionário. A nota mais valiosa é a de 500 mil, e a mais chulé é a de 100 (cem mesmo, não cem mil). Não que 100 dongs sirvam pra muita coisa: numa ida a um banheiro público, você já gasta milzinho, e a bebida mais barata ou a bugiganga mais ínfima nunca vão custar menos do que alguns milhares. 

 

Todas as notas do dong trazem o rosto do líder Ho Chi Minh, o que nos leva a mais um item onipresente no Vietnã... 

Tio Ho! 

Hồ Chí Minh (1890-1969), revolucionário que liderou os norte-vietnamitas contra os Estados Unidos e os "fantoches" do Vietnã do Sul (como eles os chamam por lá), é figurinha fácil no Vietnã de hoje. Como Mao Tsé-tung na China, o rosto do "Uncle Ho" estampa camisetas, quadros, souvenirs, e seu nome rebatizou a antiga Saigon, que agora é Ho Chi Minh City ou simplesmente HCM. Também como Mao, seu corpo está embalsamado e exposto em um memorial em praça pública, mesmo que ele tenha deixado claro que queria ser cremado. 

 


"Sob a bandeira do tio Ho, somos um exército invencível", diz a legenda. 

Tentei visitar o mausoléu do Ho, mas os horários pouco convidativos foram empecilho. Em compensação, visitei a casa onde ele morou. E morou bem: um bangalô bem ajeitado, um lagão bem aprazível e uma invejável mini-coleção de carros na garagem. Mandou bem, tio Ho! 

 

 

Quem

Lucas Paio já foi campeão mineiro de aviões de papel, tocou teclado em uma banda cover de Bon Jovi, vestiu-se de ET e ninja num programa de tevê, usou nariz de palhaço no trânsito, comeu gafanhotos na China, foi um rebelde do Distrito 8 no último Jogos Vorazes e um dia já soube o nome de todas as cidades do Acre de cor, mas essas coisas a gente esquece com a idade.

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