22/01/2008

Under the Hood



Um dia eu tive oito anos e vi cair em minhas mãos o tal do Manual do Super-Herói. Pra um moleque que repetia com exatidão os movimentos do Jiraya, encenava com bonequinhos a cena do Coringa caindo no ácido, e voava vestido de Super-Homem ao som da trilha de John Williams, um Manual do Super-Herói era o tipo de leitura que despertava interesse.

E ao contrário dos monólogos do Jiban, que deviam ser péssimos e a gente nem percebia, o livro era realmente bem feito, com textos criativos e cartuns ilustrando todas as páginas (sem pular uma). Era um manual completo, contando a história dos super-heróis desde os deuses da mitologia, apresentando os pré-requisitos da profissão ("Ser vacinado. Contra a raiva, principalmente. Tem muito cachorro por aí que não sabe distinguir um super-herói de um carteiro ou um coletor de lixo"), sugestões de matérias-primas para os poderes (fogo, água, borracha, madeira), as lições da Escola de Super-Heróis, o dia-a-dia de um super-herói, o salário de um super-herói, a bolsa de valores dos super-heróis.

O problema era que o livro não era meu. Era do filho de um amigo do meu pai, e eu precisava devolver. A edição era antiga (de 1976, o que em 1993 já era passado distante) e difícil de encontrar. No auge dos meus oito anos, numa época em que o xerox era luxo pra poucos, achei a solução: gravar em fitas cassete, narrando em voz alta, todas as 190 páginas do livro. Foram três fitinhas de áudio com minha voz de criança gripada, repletas de tosses e cachorros latindo. A iniciativa não só fez com que eu pudesse ter o manual em casa e consultar quando necessário (por ocasião de um ataque alienígena, digamos), como também propiciou que posteriormente eu gravasse outros livros e criasse minha própria locadora de talk-books.

De todas as peças perdidas da minha infância que se acabaram se encaixando com o advento da internet (por exemplo, o nome do seriado da menina que parava o tempo encostando um dedo no outro), faltava o Manual do Super-Herói e eu não sabia. Hoje, por algum enigma do cérebro, me veio ele na memória e resolvi buscar no São Google alguma pista. Ele estava lá, escaneado e completo, escondido apenas sob alguns cliques. Agora só falta lançarem os DVDs de "Perdido nas Estrelas" e do desenho de "De Volta Para o Futuro".

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Lucas Paio já foi campeão mineiro de aviões de papel, tocou teclado em uma banda cover de Bon Jovi, vestiu-se de ET e ninja num programa de tevê, usou nariz de palhaço no trânsito, comeu gafanhotos na China, foi um rebelde do Distrito 8 no último Jogos Vorazes e um dia já soube o nome de todas as cidades do Acre de cor, mas essas coisas a gente esquece com a idade.

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