Bibimbap-Bap-Lu-Bap-Lah-Béin-Bum!
Morando na China, é fácil dar um pulo na Coréia do Sul. O vôo de Beijing pra Seul dura coisa de uma hora e meia, e a maioria dos povos – brasucas inclusos – não precisa de visto. No último ano-novo chinês, feriadão que muda de data a cada ano e neste começou em 23 de janeiro, zarpamos para Seul. Só tínhamos três dias pra ficar lá, mas entre uma Beijing com clima de Beagá no carnaval e um novo carimbo no passaporte, bora viajar.
Acontece que o ano-novo coreano também obedece ao calendário lunar e é celebrado no mesmo dia do chinês. O feriado não dura 15 longos dias de restaurantes fechados e fogos de artifício barulhentos e ininterruptos, como na China – não ouvi um foguete sequer em Seul, aleluia saravá! – mas, por três dias, a maior parte das lojas fecha as portas. Justamente os três dias em que estivemos por lá.
Saímos do hotel e encontramos aquelas avenidonas desertas, com pouquíssimos transeuntes – o que é especialmente incomum para uma metrópole de 10 milhões de habitantes. A barriga roncava e não havia nem uma carrocinha de cachorro-quente pra salvar o dia. Um mercado aberto compridão oferecia peixes, camarões, lulas, algas marinhas, raízes, pimentas, temperos e até sacões enormes de pipoquinhas estilo Aritana (!), mas nada que pudesse saciar o bucho de um visitante ali,in loco .
A essa altura já tínhamos desistido de encontrar um restaurante: os únicos estabelecimentos abertos, por alguma razão que me foge à compreensão, pareciam ser as lojas de lâmpadas e abajures (mentira: também vi uma vendendo serras elétricas). Qualquer misto quente, méquidônalde ou espetinho de gato estava valendo. E finalmente, depois de muito caminhar, cantar e seguir a canção, deparamo-nos com o impensável: um restaurante! De comida coreana! Aberto!
A comida coreana é popular aqui em Beijing, onde vivem dezenas de milhares de sul-coreanos (e também não é tão difícil encontrar norte-coreanos). Minha predileta é o churrasco, que até já ganhou um post aqui no Boca. Mas nunca fui viciadão na comida da península, minha maior ressalva sendo o sabor assaz apimentado quase onipresente nos pratos. Minha primeira providência antes de sair nas ruas de Seul, aliás, foi pedir para o camarada do hotel anotar num papelzinho como é que se diz "not spicy, please" no idioma local.
Mas todas as minhas experiências gastronômicas na Coréia foram jóia, a começar por esse primeiro almoço. Pedi um prato famoso com nome que lembra groove de bateria: bibimbap. É basicamente um mexidão tudoaomesmotempoagora, com arroz no fundo, uma espessa camada de vegetais sortidos e quiçá uma carninha, além de um ovo de gema mole por cima. Você mistura tudo com afinco e manda pra dentro. Também pedimos uma panqueca de frutos do mar que foi uma boa pedida, embora carinha que só.
Garçonete-mãos-de-tesoura
Todos os pratos, não importa se fossem bibimbap, churrasco, panqueca ou macarrão, vinham sempre acompanhados de diversos pratinhos complementares, geralmente apimentados e incluindo o indefectível kimchi. O repolho picante é praticamente um símbolo do país e Seul abriga até um Museu do Kimchi, que segundo o site exibe mais de 80 variedades diferentes do troço. Não, obrigado – se fizessem um museu sobre soju ou makkeoli, as bebidas tradicionais da Coréia, eu até pensava em visitar.
Quem me falar o que exatamente tinha nesses 6 pratinhos ganha um brinde do blog.
Makkeoli, vinho de arroz que se bebe nessa cumbuquinha de metal.
Deliciosos espetinhos de batata frita em espiral.
Já com a pança cheia, continuamos nossas andanças e descobrimos que aquele clima de "Eu Sou a Lenda" não se espalhava por toda a cidade: nós é que demos o azar de escolher hotel numa região onde todo mundo saiu de férias. Felizmente, havia muitos mercados, cafés, bares e atrações abertas, bastava só se aventurar por outras bandas. A noite de ano-novo (lunar), por exemplo, passamos em uma ruazinha repleta de bares, na companhia de alguns amigos que também fugiram de Beijing por uns dias. Perto da meia-noite brindamos soju e fizemos contagem regressiva, mas os coreanos nas outras mesas nem tchum. É que ao contrário do nosso reveillón, em que o momento fugaz entre as 23h59min50s e a meia-noite é o ponto alto da comemoração, no ano-novo lunar você não fica com a sensação de ter perdido a festa se por acaso estiver no banheiro ou dormindo na hora da virada.
No próximo post: como se alfabetizar em coreano, um espetáculo cômico-culinário e que inveja do metrô de Seul.
Publicado originalmente no Boca de Gafanhoto